segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Decisão do TSE pode poupar centenas de políticos cassados

NOTA PÚBLICA: CONSEQUÊNCIAS DO JULGAMENTO DO RCED N° 703

Entenda o caso

Na Sessão de 21 de fevereiro, quinta-feira, o Tribunal Superior Eleitoral, ao julgar o Recurso contra Expedição de Diploma n° 703, movido contra o governador do Estado de Santa Catarina, Luiz Henrique (PMDB), decidiu, por uma maioria apertada (4 a 3) alterar a sua jurisprudência histórica, para anular todo o processo desde o seu início, a fim de que fosse realizada a notificação do Vice-governador para também se defender no processo. O argumento utilizado foi o de que existe um dano inconstitucional aos direitos do vice, já que, caso a ação seja julgada procedente, ele perderá o mandato junto com o chefe do Executivo estadual. Haveria, aí, ofensa ao princípio da ampla defesa.

E antes, qual era o entendimento?

A Justiça Eleitoral sempre entendeu que essa notificação era desnecessária. Entendia que não existe tal ofensa ao promover-se a notificação apenas do titular. É que os registros eleitorais do titular e do vice são feitos concomitantemente. Constituem o que se chama de universalidade jurídica. O representante da “chapa” é aquele que a encabeça. Daí a desnecessidade de notificação do vice. Além disso, se concedia ao vice o direito de ingressar voluntariamente no processo como assistente do titular.

A efetividade das demandas eleitorais

Há um fator prático a recomendar que a notificação seja feita apenas na pessoa do representante da “chapa”: o tempo do processo. Assim que tem início o mandato inicia-se uma contagem regressiva que se aplica também a todas as ações e representações em que se pleiteia a cassação do candidato eleito. É que com o término do mandato ocorre o que se chama de “perda do objeto”. Em outras palavras, o processo é extinto por não poder mais produzir nenhum resultado útil.

Quanto maior o número de partes do processo, maior o número de notificações (para se defender) e de intimações (para comparecer a atos do processo ou para cumprir outras determinações judiciais). Os prazos processuais são dilatados e fica mais complexa a realização de atos como perícias judiciais. Considerado o grande número de recursos disponíveis, é muito grande a chance de que ações em que se apuram atos concretos de corrupção eleitoral não venham sequer a receber uma decisão final.

A fundamentação da decisão do TSE

Os fundamentos utilizados pela maioria dos Ministros do TSE para determinar a anulação do processo se baseavam, como vimos, na necessidade do exercício de defesa pelo vice. Já demonstramos que essa defesa não resta prejudicada, pois não são os direitos individuais dos candidatos os que são defendidos na demanda, mas os direitos coletivos dos membros da “chapa eleitoral”, representadas em juízo por aqueles que as encabeçam.

Para suprir a falta de precedentes da própria Justiça Eleitoral que servissem de base para a mudança verificada, foi lembrada uma decisão do Supremo Tribunal Federal, proferida na Ação Cautelar n° 112, julgada em 01 de dezembro de 2004.

O caso julgado pelo STF em nada serve de base para a decisão do TSE. Naquele caso, o juiz eleitoral decidiu pela cassação do prefeito de Serra Negra do Norte (RN), mas expressamente absolveu o vice das mesmas acusações de captação ilícita de sufrágio (compra de votos). Só houve recurso da parte relativa à cassação do prefeito, sem menção à absolvição do vice. O Tribunal Regional Eleitoral havia determinado que a cassação se estendesse também ao vice. O STF, por sua vez, corretamente, impediu a aplicação da sanção ao vice, pelo fato de ele haver sido absolvido, não por ele não haver sido notificado para se defender. Trata-se de caso completamente diferente. O precedente não poderia, portanto, ter sido invocado.

Veja o que diz a decisão do STF na AC n° 112:

Sob pena de ofensa à garantia constitucional da coisa julgada, não pode tribunal eleitoral, sob invocação do chamado efeito translativo do recurso, no âmbito de cognição do que foi interposto apenas pelo prefeito, cujo diploma foi cassado, por captação ilegal de sufrágio, cassar de ofício o diploma do vice-prefeito absolvido por capítulo decisório da sentença que, não impugnado por ninguém, transitou em julgado (grifamos).

Como se vê, foi a falta de recurso contra a parte da decisão que expressamente absolvia o vice-prefeito que motivou a mudança da decisão pelo STF. Deixou-se de aplicar a decisão de cassação contra o vice-prefeito não por causa da sua não notificação para responder a demanda, mas em respeito ao princípio constitucional da coisa julgada.

Conseqüências

Efeitos práticos do precedente criado no julgamento do RCED n° 703, sãos os seguintes:

a) em relação ao pedido de cassação do Governador do Estado de Santa Catarina: o julgamento não foi apenas adiado; acontece na verdade que todo o processo foi anulado ab initio (desde o início), para que o Vice-governador possa se defender. Isso invalida todo o processo a partir da petição inicial, inclusive os três votos que já foram pronunciados, os quais haviam sido no sentido da cassação do governador. Para que esses votos sejam restabelecidos, será necessário que voltem a ser proferidos pelos Ministros. Entretanto, pelo menos um dos que já havia votado pela cassação não mais poderá fazê-lo. Trata-se do Ministro Gerardo Grossi, que inicialmente havia votado pela cassação, mas depois mudou seu voto em sessão para acompanhar a tese de que o feito deveria ser anulado. Como ele não mais integra o TSE (saiu da Corte no dia 21 de fevereiro), não poderá mais “ratificar” o voto pela cassação.

b) em relação a outros processos, todas as ações e representações que tratam de pedidos de cassação de registro de prefeitos, governadores e senadores terão que ser anulados e recomeçar do ponto inicial, acaso seja estendida a eles a orientação adotada no RCED n° 703. Centenas de processos iniciados nas Eleições de 2004 até hoje tramitam na Justiça Eleitoral. Estes terão que ser anulados e reiniciarão sua marcha, de uma forma agora ainda mais complexa. Não será possível sua conclusão até o final do mandato dos atuais prefeitos.

Com relação às Eleições de 2002, a decisão beneficiará políticos que já receberão decisão desfavoráveis no âmbito dos TREs. Esse é o caso do governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima, duas vezes cassado pelo TRE da Paraíba.

O precedente também beneficia políticos como Expedito Junior, Senador cassado pelo TRE de Rondônia, e Joaquim Roriz (que estava prestes a ver julgada pela representação em que era acusado de desvio de serviços governamentais para propósitos eleitoreiros). Como os suplentes de Senador são afastados em caso de este ser cassado, é possível que o TSE anule os processos desde o início para determinar que aqueles também sejam notificados.

Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral

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